terça-feira, 19 de janeiro de 2010

A Figura Frei Luís de Sousa

Frei Luís de Sousa – Manuel de Sousa Coutinho
Manuel de Sousa Coutinho, filho de Lopo de Sousa Coutinho e de D. Maria de Noronha, nasceu em Santarém no ano de 1555 e faleceu em Lisboa no ano de 1632.
Cavaleiro da ordem militar de Malta, entre os anos 1576-1577, quando viajava pelas índias ocidentais e orientais foi aprisionado por piratas e esteve cativo em Argel.
Esteve ao serviço do rei de Espanha Filipe II, que o recompensou com uma boa quantia, e foi promovido a fidalgo escudeiro.
Por volta de 1583 casa com D. Madalena de Vilhena, viúva de D. João de Portugal desaparecido na batalha de Alcácer-Quibir. Do casamento de D. Madalena com D. João nasceram três filhos: D. Luís de Portugal (morto em Ceuta), D. Joana de Portugal e D. Maria de Vilhena, os quais foram educados pelo novo casal que, por herança da mãe de D. Madalena, eram detentores de uma grande fortuna. A partir de 1590 a família vai viver para Almada, onde Manuel de Sousa Coutinho passa a desempenhar diversos cargos. Em 1599 é nomeado Capitão-Mor de Almada, com o posto de coronel.
No ano de 1600, Lisboa encontrava-se assolada pela peste e os governadores do reino quiseram instalar-se em Almada, em sua casa, devido a conflitos existentes entre ambos, mas D. Manuel sentindo-se ofendido e para impedir tal violência, lançou-lhe fogo. Parte para Espanha, evitando assim dissabores e passados um ou dois anos volta a Portugal devido às saudades que já tinha de sua mulher e de sua filha.
Em 1613 falece-lhes sua única filha D. Ana de Noronha. Decidem ambos professar, D. Manuel no convento de S. Domingos de Benfica e D. Madalena no convento do Sacramento. Mudam ambos de nome. D. Manuel adopta o nome de Frei Luís de Sousa e D. Madalena o nome de Sóror Madalena das Chagas.
Produz diversas obras e morre em 1632.
Como personalidade histórica e criador literário, Manuel de Sousa Coutinho era um homem corajoso, nobre, defensor dos seus ideais, patriota, nacionalista, audaz, determinado, marcando assim a época em que viveu (séc. XVI).
Algumas das obras que Frei Luís de Sousa produziu:
. Navigatio antartica ad doctorem franciscum guidum, civem panamensem
. Vida de don frei Bartolomeu dos mártires (1619)
. Crónica de S. Domingos:
. Primeira parte da história de S. Domingos (1623)
. Segunda parte da história de S. Domingos (1626)
. Terceira parte da história de S. Domingos (1678-terminada por Frei Luís de Soutomayor)
. Anais de el-rei D. João III (1844)
. Vida de Sóror Margarida do Sacramento
. Considerações das lágrimas que a Virgem Nossa Senhora derramou na Sagrada Paixão (1643)
. Vida do beato Henrique Suso da ordem dos pregadores traduzida de latim em português (1642)
Adaptação Literária
Como figura literária de Manuel de Sousa Coutinho na obra de Almeida Garrett “Frei Luís de Sousa” encontra-se muito próxima da sua vida, apenas sabemos é que existem certas “versões” na obra que foram baseadas em lendas ou mitos. Exemplo:
Não se conhecem as verdadeiras razões que levaram D. Manuel e D. Madalena a seguir a vida religiosa e entre várias versões e opiniões diferentes, e sobre a desconhecida doença ou causa que levou à morte de sua filha, Almeida Garrett produziu a obra literária “Frei Luís de Sousa”, onde as razões apresentadas para a morte de sua filha (Maria na obra), é ela sofrer de tuberculose, eles que tinham recebido a nova inesperada de que D. João de Portugal desaparecido, se encontrava ainda vivo na Terra Santa. Com isto a vida deles tornara-se impossível e decidiram seguir a vida religiosa, professando ambos.
Fonte: http://www.notapositiva.com/trab_estudantes/trab_estudantes/portugues/11freiluisdesousa.htm Autores: Ana Raquel Antunes e Graça
Recolha e daptação da informação feitas pela Andreia Verdugo do 11ºF

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

"Frei Luís de Sousa"

Obra-prima do teatro português (a partir da representação de uma “comédia de feira” na Póvoa do Varzim, da leitura de uma memória do bispo de Viseu e do parecer sobre o Cativo de Fez).

No Frei Luís de Sousa, tudo nos é dado pela expressão, em que a máxima simplicidade se alia à máxima intensidade dramática. O diálogo, intermitente, cortado de reticências expressivas mas cheio de naturalidade, vai-nos revelando a pouco e pouco a natureza das personagens, os terrores e os anseios, a serenidade e o arrebatamento - tudo quanto os factos vêm fatalmente confirmar, criando, por vezes, novos e irrequietos estados de alma. Assim, sem solução de continuidade no decurso da acção, se vão desenhando e ganhando vulto as personagens fundamentais: Madalena, a mulher arrebatada, feita de lágrimas e de sentimentos, de superstição e de remorso, que só nos braços do marido encontra lenitivo para os angustiosos receios que nem o amor da filha pode vencer; Manuel de Sousa, o cavaleiro sem mácula, o homem equilibrado e decidido, de nobilíssimo carácter, consciente da morte de D. João de Portugal, é o único que opõe à dor a frieza de uma razão esclarecida; Maria, a adolescente precoce, que lê nos olhos e nas estrelas, a vítima inocente predestinada a expiar as faltas dos pais, de cujo temperamento é a resultante fogosa e doente. Figuras ao mesmo tempo ideais e a escorrer humanidade, constituem a galeria, completada pelo Romeiro, o homem que já não tem mais onde armazenar a dor e a deixa extravasar em vingança inútil e injusta, e pelo velho Telmo Pais, que de simples comparsa se transforma em personagem viva ante o terrível dilema da opção entre o que foi o seu menino e senhor e aquele que é agora o seu anjo do céu.

A TRAGÉDIA CLÁSSICA

A tragédia clássica da Antiguidade centra o nódulo da acção num conflito que leva as personagens a interrogarem-se sobre o sentido da existência e o destino do homem, sobre a validade dos decretos promulgados pelas autoridades estabelecidas e os mandados dos deuses. A todo este sistema de formas, que comprime e pesa sobre a liberdade individual, o cidadão, o homem opõe o seu vivo protesto e lança um desafio (hybris) aos deuses e à ordem constituída.

À hybris responde a vingança, a punição, o ressentimento, uma espécie de ciúme ferido pela corajosa atitude assumida pelo homem, – a nemesis. O coro actua como um travão ao ímpeto libertário do indivíduo, aconselhando a moderação, a serena contenção, e traduz as ideias e sentimentos da média humana. Os acontecimentos desenrolam-se segundo os actos das personagens e os logros do destino, da necessidade do fatum (ananké); encadeiam-se uns nos outros, e, por vezes, precipitam a acção no seu curso através das peripécias que acabam por voltar o rumo do drama em sentido inesperado (catástrofe). Esta mudança brusca é muitas vezes levada a cabo por um reconhecimento (agnórise) de laços de parentesco até então insuspeitados.

A importância das personagens dentro do conflito dramático está também devidamente hierarquizada. Segundo o papel maior ou menor que desempenham na acção, ao protagonista seguem-se os deuteragonistas e tutagonistas, personagens respectivamente de segunda e terceira categoria. O coro encontra-se no fundo desta classificação, se se adoptar o critério de associá-lo com o desenvolvimento da acção, da qual pode ser legitimamente excluído, visto que a sua intervenção se reduz a um mero comentário sobre os acontecimentos e atitudes das personagens, em especial do protagonista. O andamento da acção obedece ainda a uma intensidade determinada, que lhe confere a qualidade dramática que a caracteriza. De início os acontecimentos desdobram-se perante o espectador numa naturalidade aparente, que logo começa de se carregar de conteúdo emocional, e levantam-se no seu espírito a suspeita de que algo horrível se prepara, uma tensão e uma curiosidade da atenção, uma expectativa, que o levam a tomar partido perante o que se passa na cena e a participar das apreensões, inquietudes e sentimentos das personagens. A esta primeira fase ou estado da acção dá-se o nome de epístase. Tem conhecido uma aura gloriosa em todo o teatro europeu e agora ganhou novos foros de popularidade na arte cinematográfica, onde aparece, em linguagem técnica, sob o nome do termo inglês suspense.

Chega-se então ao ponto culminante da acção. O conflito do protagonista com os deuses ou as autoridades da cidade, ou com ambos, consequência do seu descomedimento libertário e individualista, adensa-se, semeia-se de consequências patéticas, avoluma-se num crescendo inquietante (clímax), até se resolver numa reviravolta brusca e brutal dos acontecimentos – a catástase. Esta fase resume a essência do trágico e condensa as consequências finais da acção do protagonista e das personagens que com ele estão ligadas.

Aristóteles analisou ainda a tragédia dum ponto de vista psico-social. Para ele, o elo que se estabelece entre o espectador e a acção dramática, essa participação interessada no devir dos acontecimentos, causadora de estados de endopatia (dentro de), tinha uma função de catharsis, que, segundo a interpretação crítica mais corrente, se destinava a purificar o espectador das suas tendências imorais ou anti-sociais, uma espécie de válvula de escape de forças psíquicas e cargas emocionais, que não encontram conduto próprio para se liberarem. Situe-se, assim, a tragédia num plano de utilidade social idêntico ao do psicanalista na sociedade moderna, que até importou o termo para o seu vocabulário especializado. O agenciamento da acção dramática da tragédia visava a exibição das consequências terríveis (pathos) do descomedimento humano, de modo a sugerir no espectador o temor religioso ou a sua simpatia, dependendo assim, naturalmente, das interacções e da concepção filosófica do tragediógrafo.

Os três grandes mestres da tragédia grega foram Ésquilo, Sófocles e Eurípedes.

In Dicionário da Literatura, J.P. Coelho

TRAGÉDIA >TRAGOS – bode que se sacrificava nas cerimónias religiosas dedicadas a Dioniso, deus do vinho.

ELEMENTOS DA TRAGÉDIA

HYBRIS – desafio aos deuses e à ordem constituída;

NEMESIS – vingança, punição, espécie de ciúme ferido pela atitude corajosa do Homem;

FATUM (ANANKÉ) – o destino

PERIPÉCIA – os acontecimentos encadeiam-se uns nos outros;

AGNÓRISE – reconhecimento de laços de parentesco;

CATÁSTROFE – alteração inesperada do rumo do drama.

FASES DA ACÇÃO

EPÍSTASE – os acontecimentos desdobram-se numa neutralidade aparente, que logo começa de se carregar de conteúdo emocional e surge a suspeita de que algo de horrível se prepara;

CLÍMAX – o conflito adensa-se, avoluma-se;

CATÁSTASE – reviravolta brutal e brusca dos acontecimentos.

FUNÇÕES DA TRAGÉDIA

CATHARSIS – purificar o espectador das tendências imorais ou anti-sociais;

PATHOS – mostrar as consequências terríveis tendo em vista o temor religioso ou a sua simpatia.

FREI LUÍS DE SOUSA - DRAMA? TRAGÉDIA?

Etimologicamente, drama pode aplicar-se a qualquer obra de teatro. Logo, dramaturgo é todo e qualquer autor teatral. Denominamos de género dramático o género literário que abrange as produções concebidas para se representarem, subordinadas a determinados preceitos técnicos e espectaculares.

Ainda que o próprio Garrett classifique a sua obra genericamente de drama, a verdade é que ele próprio reconhece que – a obra magnífica é uma tragédia.

Como drama apresentaria esta obra – um retalho da vida normal de gente adulta, temperada de lágrimas e risos que vão assinalando a vida realmente vivida. Se fosse drama romântico deveria ter (e não tem) contraste entre o grotesco e o sublime, intimamente unidos na natureza humana, segundo Victor Hugo.

No entanto, quis Garrett que a sua obra se afastasse da forma tradicional do modelo da tragédia clássica: não foi escrita em verso, está dividida em 3 actos, não aparece o coro como elemento básico, não foram rigorosamente respeitadas nem a unidade de tempo (a acção ultrapassa as 24 horas), nem a unidade de espaço (a acção não decorre rigorosamente no mesmo local).

Mas, ao gosto da tragédia clássica, temos a nível da estrutura:

n a acção decorre toda em Almada, sendo a casa de D. João vizinha do convento de S. Domingos;

n no intervalo de uma semana, do 1º para o 2º acto, nada acontece de fundamental para o desenvolvimento lógico da acção;

n o coro da tragédia visto na figura de Telmo Pais, mero comentador ou informador nos dois primeiros actos e ainda na recitação litúrgica do ofício dos mortos, no final do III acto.

Na concepção a obra é fundamentalmente uma tragédia – a vida de uma família num período em que a desgraça se abate sobre ela como fatalidade a que são alheias as faltas e as responsabilidades humanas; é o passado que vem devorar os vivos, sem que de tal alguém possa ser culpado:

· Manuel de Sousa alia às virtudes de um português antigo, de antes quebrar que torcer, as qualidades de um chefe de família exemplar;

· D. Madalena é a esposa ideal e mãe extremosa;

· Maria, filha de ambos, um verdadeiro anjo de graça e vivacidade;

· Telmo Pais não pode ser acusado de se deixar vencer pela sua doçura cativante, fundindo em um sentimento único, a dedicação adolescente que lhe aquece a velhice;

mas

· o Romeiro traz consigo a desgraça, como mensageiro do Destino; e, para D. Madalena, os remorsos e temores das primeiras cenas vão-se adensando em aflição que irrompe em tempestade no final do Acto III; tornando inevitável a agonia e consumação do final da obra, a que não falta a vítima inocente, à decisão daquele destino implacável cuja voz o autor veladamente ia deixando ouvir nas alusões às mudanças súbitas do tempo ou à situação dos condes de Vimioso.

Do exposto se percebe porque o Frei Luís de Sousa, embora rotulado pelo seu autor de drama “pela índole há-de ficar pertencendo sempre ao antigo género trágico”. Não está escrito em verso porque “repugnava-me pôr na boca de Frei Luís de Sousa outro ritmo que não fosse o da elegante prosa portuguesa que ele, mais do que ninguém, deduziu com tanta harmonia e suavidade”.

No final considera que a sua peça aponta para a missão nacionalista do teatro, critica o dramalhão estereotipado, realçando a simplicidade dramática e a finalidade didáctica do teatro.

Se pelo conteúdo psicológico e pelo assunto, que é nacional, se considera o Frei Luís de Sousa uma obra romântica, muitos aspectos o aproximam do figurino da tragédia clássica.

É clássico:

· pela arte da solenidade clássica;

· pelos sentimentos dos dois esposos, angústia, incerteza, remorso, amor, ansiedade;

· pelo ambiente de tragédia, felicidade perturbada pelo remorso, desenlace trágico, precipitado, poucas personagens e (com excepção de Frei Jorge e de Manuel de Sousa) entregues aos seus destinos, mas psicologicamente definidas;

· pelo sugestivo do cerimonial católico;

· pela obediência, em parte, à lei das três unidades que só falha por causa do incêndio. Este surge para adensar o ambiente trágico, quer na violência de sentimentos que faz viver, quer na forçada mudança de residência; da primeira, onde madalena se encontrava feliz, para o ambiente austero, sombrio e pesado da antiga residência de D. João de Portugal, onde se desenrola o Acto II com a terrível constatação da verdade terrível – a sobrevivência do primeiro marido. Espaço e tempo actuam, pois, como forças que servem ao desenrolar da acção consequente;

· pela penetrante intuição psicológica da experiência pessoal do autor - o “eu” e as suas contradições;

· pelo fatalismo - todos estão sob o domínio do destino, contra o qual nada podem. Ver a tentativa de Madalena para salvar o retrato do marido numa curiosa adivinhação do que poderia significar a sua destruição. Observe-se, ainda, D. Madalena e o fatalismo (Acto III) ligado ao dia de Sexta-feira – o dia em que o marido e a filha a deixaram entregue ao seu destino – era um dia cheio de ligações com a sua vida. Por isso o teme. Em Manuel de Sousa (porta-voz de Garrett) não se sente a mesma ressonância dramática quando diz: ”É hoje sexta-feira... É que eu precisava de ir hoje a Lisboa... hoje não pode ser” (Acto III - cena V);

· pela acção, que é sintética. Quem a polariza é D. Madalena, com o consequente sentido de vazio, o qual é, talvez, ainda mais doloroso no Romeiro que agira com frieza e só conseguiu destruir um lar;

· pelas personagens, que são poucas, nobres e actuais (não se observa no drama romântico);

· pelo desafio (hybris) de Manuel de Sousa, incendiando o palácio e, já antes, com o casamento de D. Madalena;

· pelo pathos - estado de angústia permanente de D. madalena, a protagonista;

· pela morte de D. Maria, em cena, motivada pelo seu destino (a ananké) pecaminoso: “Eu não sei nada, só sei que não sou aquilo que deveria ser”. Note-se a natureza melodramática dessa cena e daquela em que D. João de Portugal se ilude pensando que se lhe referem as palavras ansiosas de D. Madalena: “Esposo, esposo, abri-me, por quem sois...” (Acto III, cena VI). P problema de D. Maria é visto à luz do séc. XIX e subjectivamente por Garrett. No séc. XVII não sofreria o mesmo drama psíquico, porque receberia o bálsamo consolador da religião que professava. São situações destas que aumentam o aspecto espectacular que a peça assume, principalmente no Acto III;

· a tragédia grega preceituava a morte fora de cena pela compaixão que movia;

· pelo clímax - a tragédia adensa-se sucessivamente desde que progridem os pressentimentos - e culmina com a peripécia (o reconhecimento - agnórise: “ninguém”);

· por momentos há a proximidade do prólogo clássico - na fala de Telmo quando apresenta Manuel de Sousa, e na fala deste à filha, referindo-se a D. João de Portugal. Por isso, em qualquer das duas cenas correspondentes (e depois na cena I do Acto III) predominam as falas mais extensas e as cenas são mais longas, ganhando nelas a peça interesse psicológico. As cenas seguintes são mais curtas, e favorecem a aproximação do fecho com toda a grandiosidade de que se reveste nos três actos: o incêndio, a revelação do Romeiro – Ninguém – e a morte de Maria. O diálogo tem falas mais curtas, é mais rápido e sempre fortemente sugestivo: “hoje... 6ª feira...! – Oh! querida mulher minha (a transposição do possessivo)... - A mim... – Terá... – Sim, mas... Homem, acabai!... Ninguém.”;

· pela sobrevivência do coro na figura de Telmo (Actos I e II) e nos salmos cantados no Acto III;

· há uma condensação de tempo, de acordo com as leis da tragédia (só os desfechos);

· não há mistura de cómico e do trágico.

Aspectos dramáticos/românticos

· A feição nacionalista, com tradição em António Ferreira;

· a acção desenrola-se em 3 actos e a sua natureza histórica é romântica;

· é escrita em prosa;

· a linguagem de Garrett nos momentos de maior choque psicológico encurta as frases e insiste nas formas reticentes, exclamativas, interrogativas e nas repetições;

linguagem coloquial, adaptada às situações que se vivem e às personagens envolvidas.

“FREI LUÍS DE SOUSA” (1843)

1. Uma atitude romântica perante a história

Relação entre a problemática política e os problemas individuais:

· papel determinante da batalha de Alcácer Quibir sobre o futuro das personagens (2º casamento de D. Madalena);

· implicações da decisão tomada pelos governadores castelhanos (regresso da família ao palácio de D. João de Portugal);

ausência de Manuel de Sousa no momento do regresso do Romeiro, consequência da “benevolência” dos governadores.

Tratamento literário de uma época da História de Portugal:

· acção situada no séc. XVII;

· personagens correspondentes a figuras históricas;

trabalho de reconstituição histórica: cenários, vestuário, linguagem, referências culturais (repercussão da Reforma) e factológicas (peste em Lisboa).

Valorização da questão da identidade nacional:

· o ideal da independência (defendido por Manuel de Sousa);

· a tradição cultural portuguesa (referências a Bernardim Ribeiro e Camões);

· povo encarado como entidade abstracta, mitificado e portador de mitos (D. Sebastião).

2. O gosto pela realidade quotidiana

Locais da acção: a casa, um espaço concreto – situação. Arquitectura, mobiliário e decoração.

Suporte da relação entre as personagens – a família:

· marido - mulher

· mãe - filha; pai – filha

· irmãos, cunhados

· tio - sobrinha

· núcleo familiar central integra os criados (Telmo, Miranda) com funções diferentes do teatro clássico.

Acções e gestos do quotidiano, presenciados ou relatados:

· ler, escrever, estudar;

· passear, viajar, visitar;

· dormir, etc..

Preocupações que revelam a “vida privada” das personagens:

· a doença;

· os acidentes de viagem;

· as normas de convivência social (visitas, agradecimentos).

Aproximação do nível de língua corrente e familiar em certas circunstâncias (falas de Maria, outras personagens dirigindo-se a Maria).

3. Estatuto romântico das personagens

Confronto permanente entre o indivíduo e a sociedade - felicidade individual contrariada pelas normas colectivas (código moral estabelecido, regime político totalitário):

· incêndio do palácio ½

· tomada de hábito ½ os grandes amores impossíveis

· morte de Maria ½

Conduta individual pautada por valores codificados, próprios duma classe social - a aristocracia: honra, coragem, fidelidade, memória dos antepassados, abnegação.

Referência constante ao cristianismo, à religião e ao culto.

Importância da problemática da morte: temida, desejada, assumida.

Tendência para os comportamentos violentos, negativos e positivos (as grandes decisões, as grandes acções, as grandes hesitações, os grandes temores, os grandes arrependimentos).

4. A acção comandada pelo destino

Linguagem que remete para lá da cena:

· subentendidos;

· frases incompletas, reticências;

· ambiguidades de sentido, equívocos.

Uma personagem que remete ora para o passado, ora para o futuro: Telmo (atitude que o aproxima do coro da tragédia clássica.

Uma personagem presente, sobretudo quando ausente: D. João de Portugal (conversas, retrato, figura do Romeiro).

Conjunto de coincidências que se revelam fatais:

· locais em que se passam acções - palácio de D. João de Portugal;

· dias em que se passam acções - regresso do Romeiro;

· circunstâncias em que se passam acções - ausência de Manuel de Sousa.

Preparação do desfecho a partir da primeira cena:

· preparação do ambiente (estado de espírito de Madalena, Telmo; Maria);

· preparação das circunstâncias (decisão dos governadores, decisão de Manuel de Sousa, saída de Manuel de Sousa);

· preparação de solução (doença de Maria, referência a Inês de Castro, exemplo dos Condes de Vimioso).

Anulação sistemática das hipóteses de alteração da situação:

· cedência de D. Madalena - ida para a casa de D. João de Portugal;

· cedência de D. Madalena - ida a Lisboa de Manuel de Sousa e Maria;

· não cumprimento da proposta do Romeiro a Telmo;

· não cedência de Manuel de Sousa A madalena - decisão irrevogável de tomar o hábito.

5. Uma peça de teatro

Conjunto de 3 actos constituídos por cenas (12, 15 e 12, respectivamente), definidas pela entrada e saída de personagens cujo número em cena é muito variável: do monólogo (Madalena, Telmo, Jorge) ás cenas de conjunto (últimas cenas do 1º e 3º actos).

Semelhança de organização interna dos três actos:

· Acto I – ponto da situação

· Acto II – preparação da acção

· Acto III – acção.

Simetria de construção dos dois primeiros actos:

· função da presença de Telmo

· função das entradas de Jorge e Manuel de Sousa

· cena final espectacular

Alternância de cenas com funções diferentes:

· fornecer informações sobre o passado e o presente;

· caracterizar personagens e ambientes;

· preparar os saltos na acção;

· fazer a transição para a cena seguinte (assunto, tempo, personagem);

· mostrar os acontecimentos (fogo, chegada do Romeiro, cerimónia religiosa e morte).

Frei Luís de Sousa, Realização de António Lopes Ribeiro, 1950

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domingo, 10 de janeiro de 2010

Almeida Garrett

João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett, visconde de Almeida Garrett, escritor romântico, orador, Par do Reino, ministro e secretário de Estado honorário português. Nasceu no Porto, a 4 de Fevereiro de 1799, e faleceu em Lisboa, a 9 de Dezembro de 1854.
Filho de António Bernardo da Silva Garrett e Ana Augusta de Almeida Leitão, o escritor passou parte da infância em Portugal continental, mas teve de seguir para os Açores (Angra do Heroísmo) quando as tropas francesas de Napoleão Bonaparte invadiram Portugal. Nos Açores foi instruído pelo tio, Dom Alexandre, bispo de Angra. Em 1818 seguiu para Coimbra, onde se matriculou no curso de Direito. Ainda em 1818 publicou O Retrato de Vénus, trabalho que lhe custou um processo por ser considerado "materialista, ateu e imoral".
Participou da revolução liberal de 1820, seguindo para o exílio na Inglaterra em 1823, após a Vilafrancada. Antes havia casado com Luísa Midosi, de apenas 14 anos. Foi em Inglaterra que tomou contacto com o movimento romântico, descobrindo Shakespeare, Walter Scott e outros autores e visitando castelos feudais, ruínas de igrejas e abadias góticas, vivências que se reflectiriam na sua obra posterior. Em 1824, seguiu para França, onde escreveu Camões (1825) e Dona Branca (1826), poemas geralmente considerados como as primeiras obras da literatura romântica em Portugal. Em 1826 foi amnistiado e regressou à pátria com os últimos emigrados, mas teria de deixar Portugal novamente em 1828, com o regresso do Rei absolutista D. Miguel. Ainda nesse ano perdeu a filha recém-nascida. Novamente em Inglaterra, publica Adozinda (1828) e Catão (1828).
Juntamente com Alexandre Herculano e Joaquim António de Aguiar, tomou parte no Desembarque do Mindelo em 1832. A vitória do Liberalismo permitiu-lhe instalar-se novamente em Portugal, após curta estadia em Bruxelas como cônsul-geral e encarregado de negócios, onde lê Schiller, Goethe e Herder. Em Portugal exerceu cargos políticos, distinguindo-se nos anos 30 e 40 como um dos maiores oradores nacionais. Foram de sua iniciativa a criação do Conservatório de Arte Dramática, da Inspecção-Geral dos Teatros, do Panteão Nacional e do Teatro Normal (actualmente Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa). Mais do que construir um teatro, Garrett procurou sobretudo renovar a produção dramática nacional segundo os cânones já vigentes no estrangeiro. Em 1838, leva à cena Gil Vicente, pouco depois D. Filipa de Vilhena e, em 1842, O Alfageme de Santarém, todas sobre temas da história de Portugal. Em 1844 é publicada a sua obra-prima, Frei Luís de Sousa, que um crítico alemão, Otto Antscherl, considerou a "obra mais brilhante que o teatro romântico produziu". Estas peças marcam uma viragem na literatura portuguesa não só na selecção dos temas, que privilegiam a história nacional em vez da antiguidade clássica, como sobretudo na liberdade da acção e na naturalidade dos diálogos.
Em 1843, Garrett publica o Romanceiro e o Cancioneiro Geral, colectâneas de poesias populares portuguesas, e em 1845 o primeiro volume d'O Arco de Santana (o segundo apareceria em 1850), romance histórico inspirado pelo Notre Dame de Paris de Victor Hugo. Esta obra seduz não só pela recriação do ambiente medieval do Porto, mas sobretudo pela qualidade da prosa, desespartilhada das convenções anteriores e muito mais próxima da linguagem falada. A obra que se lhe seguiu deu expressão ainda mais vigorosa a estas tendências: Viagens na minha terra, livro híbrido em que impressões de viagem, de arte, paisagens e costumes se entrelaçam com uma novela romântica sobre factos contemporâneos do autor e ocorridos na proximidade dos lugares descritos (outra inovação para a época, em que predominava o romance histórico). A naturalidade da narrativa disfarça a complexidade da estrutura desta obra, em que alternam e se entrecruzam situações discursivas, estilos, narradores e temas muito diversos.
Na poesia, Garrett não foi menos inovador. As duas colectâneas publicadas na última fase da sua vida (Flores Sem Fruto, de 1844, e sobretudo Folhas Caídas, de 1853) introduziram uma espontaneidade e uma simplicidade praticamente desconhecidas na poesia portuguesa anterior. Ao lado de poemas de exaltada expressão pessoal surgem pequenas obras-primas de singeleza ímpar como Pescador da Barca Bela, próximas da poesia popular quando não das cantigas medievais. A liberdade da metrificação, o vocabulário corrente, o ritmo e a pontuação carregados de subjectividade são as principais marcas destas obras.
A vida de Garrett foi tão apaixonante quanto a sua obra. Revolucionário nos anos 20 e 30, distinguiu-se posteriormente sobretudo como o tipo perfeito do dandy, ou janota, tornando-se árbitro de elegâncias e príncipe dos salões mundanos. Separado da esposa, passa a viver em mancebia com D. Adelaide Pastor até à morte desta em 1841. A partir de 1846, a sua musa é a viscondessa da Luz, Rosa Montufar Infante, inspiradora dos arroubos românticos das Folhas Caídas. Em 1851, Garrett é feito visconde de Almeida Garrett em duas vidas, e em 1852 sobraça, por poucos dias, a pasta dos Negócios Estrangeiros em governo presidido pelo Duque de Saldanha. Faleceu de cancro em 1854.
No século XIX e em boa parte do século XX, a obra literária de Garrett era geralmente tida como uma das mais geniais da língua, inferior apenas à de Camões. A crítica do século XX (notavelmente João Gaspar Simões) veio questionar esta apreciação, assinalando os aspectos mais fracos da produção garrettiana. No entanto, a sua obra conservará para sempre o seu lugar na história da literatura portuguesa, pelas inovações que a ela trouxe e que abriram novos rumos aos autores que se lhe seguiram. Garrett, até pelo acentuado individualismo que atravessa toda a sua obra, merece ser considerado o autor mais representativo do romantismo em Portugal.

Informação recolhida pela Carolina Machado do 11ºJ em www.ruadapoesia.com

Condições para o surgimento do Romantismo em Portugal

A. Culturais
Surgimento a partir de 1836 como escola, com as suas publicações e com o seu público;
As traduções da novelística estrangeira: Voltaire, Walter Scott, Alexandre Dumas (filho), preparam o público português para acolher o romance e as novelas nacionais, que vão ser influenciadas por todos eles;
O romantismo português não se pode dissociar da Revolução Liberal de 1820, da derrota dos absolutistas e das reformas institucionais, e, por isso, reveste-se de particularidades únicas;
Tem como chefes patriotas Garrett e Herculano, liberais de alma e coração, dedicados à reconstrução nacional, à reconstrução da grande Pátria através da Literatura, combatendo a decadência e a humilhação que o País vivia na altura. Chora-se o passado grandioso e deposita-se nos patriotas liberais esperanças de liberdade e de renascimento;
Herculano aviva a consciência nacional, revive a literatura oral e a novela renasce modernizada, com o contributo de Garrett e Camilo;
Restauração do Teatro;
Criação de uma escola de historiadores preocupados com o rigor científico;
Incentiva-se o jornalismo e coloquializa-se a linguagem;
A literatura é avassalada por uma linguagem corrente, mais acessível aos estratos sociais populares que estão na origem de todas as modificações políticas e sociais, históricas e culturais do séc. XIX.
B. Políticas
Implantação do Regime Liberal;
Abertura do país ao resto da Europa;
Abolição da censura;
Desenvolvimento dos meios de comunicação principalmente dos transportes ferroviários que aproximam Portugal dos grandes centros europeus.
C. Sociais
Importação de modas e gostos estrangeiros (Inglaterra, França e Alemanha);
Ruína dos fabricantes nacionais;
Aumento da nova aristocracia;
Modificações sociais a nível das classes populares.
Características Gerais do Romantismo
Desenvolvimento de uma literatura confessional, que se presta à exibição do EU e do indivíduo como único e original em sentimentos e imaginação;
Desenvolvimento e defesa da teoria de Rousseau, afirmado o indivíduo como naturalmente bom e posteriormente corrompido pela sociedade;
Glorificam-se e exaltam-se os tipos sociais marginais: o pirata, o bandido, o fora-de-lei. Perante a impotência de alcançar aquilo que deseja, nasce no romântico uma revolta metafísica e social que vai levar à sua identificação com figuras míticas e bíblicas como Prometeu, os Titãs, Satã, etc…;
O EU é tudo, aspira ao Absoluto e procura transcender a sua condição humana (influência do idealismo alemão);
O Homem é descrito na sua dimensão individual, egocêntrica, sem preocupações morais;
O EU romântico sofre de uma nostalgia profunda (sehnsucht) e busca algo de distante no tempo e no espaço, que se concretiza pelo retomar no tempo da Idade Média e pela procura de espaços exóticos, orientais, mergulhados no fantástico e no sonho;
Valoriza-se o nacionalismo estético, a cultura regional, a tradição;
Surge o pessimismo, o fatalismo popular, a metafísica do pecado, da penitência e do resgate (porque não se alcança o Absoluto);
Os sentimentos são levados ao exagero: fala-se de amor, de ciúme, de vingança, de desespero e de morte;
A mulher é personificação da fragilidade, da pureza, do espírito de sacrifício e de tão idealizada acaba por se tornar um símbolo;
A mulher pode estar na origem de tudo o que existe de maldito no herói romântico;
A "mulher anjo" opõe-se à "mulher diabo".
Classicismo
1. Predomínio da Razão e da Inteligência
2. A objectividade, o impessoal
3. Culto da antiguidade greco-latina (mitologias, personagens, lendas)
4. Equilíbrio, disciplina, clareza, ordenação
5. Representação do homem equilibrado, saudável, moralista, disciplinado e optimista
6. Gosto pela vida em sociedade
7. As realidades certas e a ausência de preocupações espirituais
8. A mulher como deusa, reflexo do amor divino (platonismo)
9. Amor racional e intelectualizado
10. Natureza luminosa, colorida, alegre, suave (Primavera e Verão)
11. Preferência pelo diurno (luz solar)
12. Paisagem convencional, aprazível, bucólica e equilibrada ("locus amoenus")
13. Preferência pelo belo aristocrático quase inatingível.
14. Versificação rígida e unidade estrófica
15. Linguagem seleccionada, pouco acessíve
16. A pureza dos géneros: a separação do sublime (tragédia) e do grotesco (comédia).
Romantismo
1. Predomínio do sentimento (coração, sensibilidade) e da Imaginação
2. A subjectividade, o pessoal
3. Culto da Idade Média (lendas e tradições) e intervenção na realidade contemporânea
4. Arrebatamento e exaltação
5. Representação do homem carregado de traumas, indisciplinado, instável e egocentrista, sem grandes preocupações morais e pessimista
6. Herói individualista e solitário revoltado contra a sociedade
7. A incerteza, a insatisfação e a angústia
8. A mulher anjo (um ser quase divino) e a mulher demónio (fatal, sedutora, que destrói todos aqueles que encanta)
9. Amor sentimental e sensorial
10.Natureza sombria, melancólica (Outono e Inverno)
11. Preferência pelo crepuscular e pelo nocturno (penumbra, sombras, luar), que propiciam o sonho e a meditação
12. Paisagem natural, livre, rude, selvática, agreste ("locus horrendus"); a paisagem é um estado de alma
13. Preferência pelo belo horrível, quotidiano e vulgar
14. Versificação livre e variedade estrófica
15. Linguagem acessível, por vezes oralizante
16. O hibridismo dos géneros: valorização de formas literárias novas (o drama romântico e o romance); a aliança do sublime e do grotesco.

Em Portugal o processo de instauração do romantismo foi lento e incerto. Enquanto o romantismo de Delacroix avançava já para um projecto renascentista e o realismo tomava forma no horizonte parisiense, o romantismo português procurava ainda afirmar-se.
A implantação do romantismo em Portugal ocorre num contexto sociopolítico. São os anos posteriores às invasões francesas, que tinham originado o refúgio da corte portuguesa no Brasil e é também o tempo em que o desejo de independência dessa colónia ganha força. Na metrópole multiplicam-se as lojas maçónicas e germinam os ideais liberais.
Travam-se as lutas civis entre miguelistas e liberais, e, por duas vezes, depois da Vilafrancada e da Abjuração da Carta, muitos partidários de D. Pedro tiveram de exilar-se em Inglaterra e França. Dois desses partidários eram os jovens escritores Almeida Garrett e Alexandre Herculano.
Segundo alguns autores, o romantismo afirmou-se entre nós como uma cultura de importação. Só compensou distâncias e atrasos pela via indirecta dos exílios a que se sujeitaram Garrett e Herculano. Foi longe da pátria que estes autores conceberam a ideia de criar uma literatura nova, de carácter nacional e popular.
Em 1825 Garrett publicou o poema Camões que passa a ser considerado o ponto de partida para a fixação da cronologia do romantismo português.
Garrett e Herculano entendiam a literatura como tarefa cívica, como meio de acção pedagógica ("A abolição dos conventos destruíra o sistema dos estudos; e se cumpria aos governos organizar a instrução pública, era obrigação dos escritores novos continuar a obra dos frades." Oliveira Martins)
Portugal era um país pequeno e decaído, saudoso da grandeza perdida. Esses patriotas, confiantes nas virtudes da liberdade, propunham-se contribuir para um renascimento pátrio.
O romantismo constitui uma tomada de consciência e uma conquista dum senso histórico e dum senso crítico novo aplicado aos fenómenos da cultura. Começa-se a relacionar o Homem com o meio a que pertence e a época de que é produto. ("O instável Carlos das viagens é o expoente de uma época de crise, um moderno que sofre de duplicidade amorosa e acaba por se emburguesar, passando de alma sensível a barão." Jacinto Prado Coelho)
Em Portugal, tal como na Europa, o romantismo manifestou-se também na pintura e na arquitectura. A evolução, na pintura, do neoclassicismo para o romantismo foi lenta e tormentosa, só tardiamente ganhou expressão entre nós. Não existiam mestres, o seu surgimento é o resultado do amor que os jovens artistas tinham à natureza. ("Deve ser no meio dos campos, em frente das maravilhas da vegetação e dos mais variados episódios da criação animada, que as ideias do pintor voam e se multiplicam." J. M. Andrade Ferreira)
Vários pintores se destacaram, mas Auguste Roquemont foi o primeiro a fixar na tela cenas de costumes populares. Tomás da Anunciação, João Cristino da Silva e Metrass são outros nomes importantes da pintura romântica. Este último, Metrass, traduz nos seus quadros uma nova situação sentimental, com um dramatismo ao mesmo tempo empolgante e mórbido. O melhor exemplo desse gosto é o célebre Só Deus, considerado por alguns a mais poderosa imagem do romantismo português.
A arquitectura do período romântico em Portugal surgiu, a par com a Europa, por via Inglesa. O monumento mais representativo do espírito romântico é o Palácio da Pena, em Sintra.
A serra de Sintra sempre empolgou as almas românticas, Garrett em 1925 escrevia:

1.Valorização do povo e da sua sabedoria antiquíssima, expressa no tesouro das suas tradições ou do seu folclore.
2. Forte acentuação do carácter original das culturas nacionais expressos nos valores literários e artísticos específicos, na sua história, nos seus mitos, no que, enfim, constitui a sua identidade.
3. Uma atitude intelectual de idealismo filosófico.
4. Uma tendência para o individualismo, isto é, para a expressão do intimismo e de uma visão do mundo sempre focalizada pelo “eu”, pelo predomínio do universo interior do artista. Temas como os da solidão, da noite, do amor e da morte foram naturalmente preferidos.
5. Um interesse exacerbado pelo indivíduo onde se concentram as linhas de força de uma humanidade que começa e acaba no protagonista do drama humano, que é o “herói” de uma epopeia sem fim, “comissário” de um Deus desconhecido ou “o eleito da transcendência” para modificar o destino.
6. Uma atitude crítica perante a razão absolutista, daí decorrendo a valorização psicológica do sentimento, da imaginação e da intuição.
7. Um desejo de fuga ao quotidiano, ao material e à realidade, levando naturalmente à busca do maravilhoso, pela pesquisa de lendas e mitos, e ao mistério do universo.
8. Uma noção de um além de coisas visíveis que leva ao carácter vago, secreto, nebuloso dos cenários românticos, mostrando ruínas, indícios, presenças inexplicáveis.
9. Um liberalismo radica, não violento, porque se dirige a libertação interior dos homens; liberdade individual, liberdade popular e liberdade nacional são as etapas para um dinamismo evolutivo.
10. Uma religiosidade muito livre que vai do cristianismo ao culto de qualquer outra religião desde que contribua para a realização secreta do ser humano.

O Romantismo em Portugal - As Lutas Liberais

Após a morte de D. João VI em 10 de Março de 1826, D. Pedro, legítimo herdeiro do trono de Portugal, sendo detentor da Coroa imperial brasileira, era considerado um estrangeiro, o que, pelas leis então vigentes quanto à sucessão, o tornava inelegível para o trono português.
A regência, nomeada em 6 de Março de 1826, apenas quatro dias antes da morte do rei, na pessoa da infanta D. Isabel Maria, declarou-o rei de Portugal. A situação, porém, não agradava nem a portugueses nem a brasileiros. Em Portugal, muitos defendiam a legitimidade do trono para D. Miguel, irmão de D. Pedro.
D. Pedro procurou uma solução conciliadora. Assim, após outorgar a Carta Constitucional a Portugal (29 de Abril de 1826), abdicou a favor de sua filha D. Maria da Glória, na dupla condição de esta desposar o seu tio D. Miguel e de este jurar a Carta.
D. Miguel não só celebrou os esponsais com a sobrinha como jurou a Carta Constitucional outorgada por seu irmão. Porém, decorrido pouco tempo, faltou ao compromisso assumido, nomeou um novo ministério, dissolveu as Câmaras em Março e, convocadas as cortes à maneira antiga, foi proclamado, pelos três estados do reino, rei absoluto.
Foram então sufocados os focos de reacção antimiguelista. Os liberais emigraram em massa, e os que ficaram foram alvo do terror miguelista. Foram presas ou degredadas milhares de pessoas, e muitas sumariamente executadas.
Os exilados, após reunirem-se na Ilha Terceira, sob os auspícios de D. Pedro, seguiram para o norte do País. Desembarcaram no Pampelido em 8 de Julho de 1832, e daí seguiram para o Porto, onde sofreriam um longo e penoso cerco. Tinha assim início uma guerra civil que se prolongaria por dois anos (1832-1834) e que levaria ao trono D. Maria II.(...)
Após o desastroso cerco do Porto e a derrota da Asseiceira (16 de Maio de 1834), o exército miguelista retirou para o Alentejo diante do avanço de Saldanha e do duque da Terceira.
D. Miguel, apercebendo-se da fragilidade do seu exército, fruto das baixas e das deserções, reuniu um Conselho em Évora (23 de Maio), em que deliberou pedir um armistício aos liberais. O general Azevedo e Lemos, comandante dos absolutistas, interpelou os generais Saldanha e Terceira com o intuito de serem discutidas as condições. Saldanha e Terceira fizeram-lhe saber que D. Pedro não aceitaria qualquer proposta que não fosse a rendição incondicional. Acrescentaram ainda que as suas tropas continuariam a avançar em direcção a Évora, onde estava estacionado o exército miguelista, até que este se rendesse. D. Miguel, vendo-se incapaz de prosseguir a guerra, aceitou a rendição nos termos que ficaram definidos na Convenção de Évora-Monte.
in Infopédia, Porto Editora. Informação recolhida pelo Diogo Branco do 11ºk

O Romantismo na Pintura

Em Portugal
Domingos Sequeira, A Morte de Camões
Soares dos Reis, O Desterrado, escultura
F. Metrass, Camões na Gruta em Macau

Na Europa
William Blake, Ancient of days
G. Courbet, Auto-retrato
Goya, La Maja desnuda
Goya, La Maja vestida